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Aprendendo a ensinar: como me tornei uma professora

Quem aconselharia alguém a se tornar professor hoje em dia? Quais argumentos poderiam ser utilizados para convencimento? Amor pela causa? Identificação com o ambiente escolar? Missão de vida? Ou simplesmente aceitar que é tarde demais para iniciar uma nova carreira? Foram dúvidas como essas que levei junto ao meu material de ensino quando adentrei a escola pela primeira vez, assumindo o título de professora.

Lembro-me deles e delas: giz e quadro negro, instrumentos que dominam bem. Poeira branca no ar quando batem as mãos, nem sempre são palmas ao mérito de um aluno. Limpam as mãos esbranquiçadas nas roupas, marcas de mais um dia no trabalho de educar. Ou usam jalecos brancos para se proteger. Têm um armário abarrotado de itens e o coração cheio de uma esperança que fingem acabar quando se zangam. Carregam livros, apostilas, e o peso de educar as futuras gerações, que um dia fomos nós e hoje são nossos filhos e netos. Muitos deles e delas lecionam para duas ou três gerações antes de aposentarem o porta-giz, nunca a vontade de ensinar.

Eles e elas (que me perdoe a gramática machista) me fizeram brincar de ser professora na infância. Claro que também fui cantora, dançarina, secretária, atriz… – menos médica, médica eu nunca fui, nem brincando. Mas, na feira infantil das profissões, abracei esse desejo de ensinar. E com o sonho de ensinar, veio o sonho de aprender. Porque, pra ensinar, temos sim muito que aprender.

Tornei-me amante do livro, um amor ao qual ninguém me apresentou. Encontramo-nos na biblioteca do acaso e foi amor à primeira lida. Ele não me julgou pela capa, ainda que eu fosse uma menina do interior de uma cidade pequena, que morava numa rua sem saída. Qual saída encontraria para aprender o que eu ensinaria depois? Quando queremos algo, aprendemos que só querer não basta, é preciso fazer algo acontecer. Quer conteúdo mais importante para trabalhar com alunos? É… o professor também é educado pela vida, como qualquer outro profissional. A diferença é que ele, ou ela, tem a chance de passar isso adiante para alguém que, com certeza, precisa de mais que física, química e línguas. Alguém que estuda história enquanto já está escrevendo sua própria história, sem saber.

Fui universitária, recebi o diploma em Letras, colei grau, joguei capelo para o alto e abracei a insegurança de não me sentir pronta para lecionar. É que meu sonho era ensinar a falar inglês, mas eu ainda não sabia falar. Lembram que eu disse “é preciso aprender para ensinar”? É uma regra para mim.

Fui intercambista, recebi certificado em Língua Inglesa, colei fotos no álbum da vida, joguei tudo para o alto e abracei a coragem de viver o desconhecido. Alcancei meu objetivo e, na volta, eu quis encarar esse desafio, porque é isso que educar significa pra mim hoje.

Os motivos são muitos e tão batidos que apanhamos só de ouvir: salários, direitos trabalhistas, recursos ou, melhor, a falta deles, indisciplina dos alunos, dupla e longa jornada de trabalho, instabilidade, falta de apoio do governo e das instituições de ensino, superproteção dos estudantes por parte de seus familiares, supervalorização dos direitos do alunos em detrimento dos deveres, desvalorização da carreira de professor, etc.

A realidade, encarada por alguém tão realista como eu, conseguiu me surpreender de várias formas. Em primeira instância, por concluir que alguns dos problemas que citei acima se encontram em um nível ainda mais elevado do que eu imaginava, sobretudo, a indisciplina e o descaso com que os alunos tratam os docentes. E, depois, por perceber que o ambiente escolar, assim como qualquer outro âmbito da vida, oferece exemplos de tudo, bastando a nós definir se vamos seguir algum deles e qual será. Entre tantas frequências à disposição, a qual delas vamos nos conectar? Associarmo-nos aos que apenas reclamam, aos mais otimistas/intimistas, aos que se esquivam ou aos amantes da causa? Acredito que, em cada uma das escolas do nosso Brasil, a sala dos professores é composta por esses e outros perfis. E temos – eu tenho – de criar o nosso próprio perfil, baseado nas nossas experiências pessoais e profissionais.

Confesso que muitos comentários e comportamentos que percebo no ambiente escolar alimentam minha vontade de desistir da carreira enquanto ainda posso repensar meu futuro. Eu mesma já devo ter alimentado essa fome de alguém. Mas, de uma forma muito sutil, eu tenho aprendido a observar mais as ações dos que pouco falam, e que parecem estar mais focados em trabalhar diariamente enfrentando todos esses desafios com um sorriso no rosto, um olhar acolhedor, uma tentativa diária de empatia com a atual situação da educação. Há quem diga que eles não fazem mais que a obrigação. Mas, num mundo feito de tantas obrigações, eu diria que eles são justamente exemplos de desprendimento da obrigação, pois se entregam além da remuneração.

Hoje talvez o porta-giz já tenha sido substituído pelo laser que aponta uma palavra projetada. O velho quadro negro esverdeado já é branco ou de vidro. Já não se sente o cheiro de álcool dos mimeógrafos. E o virtual substituirá as impressões. Mas sua impressão, ao fazer essa viagem no tempo comigo, é de que ainda há esperança? Espero que sim.

Que você, professor(a), independentemente da Disciplina ou da esfera de atuação e público alvo, reflita sobre o seu perfil em meio a tudo que se pensa e se afirma sobre a educação. Que sua escolha, depois de ter escolhido ser professor(a), seja continuar escolhendo aprender para ensinar. Aprender mais sobre o que, como e quando ensinar. Que sejamos pesquisadores, inventivos, sem medo de testar e nos testar, focando mais nas soluções que nas problemáticas, porque, quando batemos demais nos problemas, apanhamos também, e de mãos vazias.

E você, o que tem para nos contar das suas experiências como professor ou professora? Comente abaixo ou compartilhe o artigo com pessoas que você acha que possam se interessar. 🙂

O texto acima é de autoria de Milene Maciel, que compartilha conosco aqui suas experiências e vivências do processo de ensino-aprendizagem.

 

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