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Da escola da vida, uma matéria chamada “viagem”

Já que estamos de férias, convido você a fazer uma viagem comigo, não iremos muito longe se você não quiser, no entanto, caso queira, podemos cruzar fronteiras. Mas, como não devemos aceitar carona de estranhos, deixe-me primeiramente apresentar-me: sou escritora e professora, mas, antes de tudo, eu sou uma viajante, sempre fui. Na imaginação, por meio de livros, filmes e novelas, enfim, eu já dei a volta ao mundo, mas era um mundo visto pelos olhos dos outros. Eu nasci no interior, fui criada em uma rua sem saída, onde os dias pareciam ter 48 horas enquanto eu brincava de coisas que meus alunos desconhecem. Na infância solitária que tive, sobrava tempo e silêncio pra sonhar e imaginar. Demorei muito para entender que eu morava nesse mesmo mundo que eu considerava distante demais de mim. A passos curtos para as quatro direções que me cercam, eu fui percebendo que o mundo é mesmo muito grande em expansão territorial, mas se torna muito pequeno, ou melhor, próximo quando a gente sai pra visitá-lo e, assim, eu me tornei uma viajante, entre tantas que existem.

Ao conviver com meus colegas durante o último ano letivo, percebia que grande parte deles vive uma rotina “escola e casa” e isso parecia destoante da minha vida de exploradora. Praticamente todas as segundas, eu chegava com novidades de uma trilha, cidade ou atividade que tinha visto. Compartilhando minhas experiências realizadas dentro ou fora do país, percebia que alguns dos adultos que trabalhavam comigo pensavam ou viam o mundo exatamente como eu quando criança: algo distante e inalcançável. Alguns faziam comentários negativos a respeito dos riscos de minhas vivências – eu, de fato, sou aventureira -, outros se mostravam interessados ou espantados, mas todos, sem exceção, apresentavam os motivos – ou desculpas – pelos quais não viajavam, sendo os principais: tempo e dinheiro. A leitura que estou construindo não tem por objetivo oferecer dicas de planejamento de viagens, algo que, por sinal, eu adoro fazer. Meu convite inicial é que você embarque comigo para descobrir por que viajar me torna uma pessoa e profissional melhor.

1. Realização de sonhos

A cada viagem que faço eu realizo um sonho e isso fortalece a minha autoestima. Como profissional, acredito que esse é um fator relevante porque o professor é, também, um construtor de sonhos. No entanto, não posso simplesmente dizer aos meus alunos que “sonhar é preciso”. Muitos deles vivem em realidades nas quais sonhar é, até mesmo, utópico. Nesses casos, sinto que preciso realmente ensinar a sonhar, não um sonho distante, um sonho vazio, que possa até mesmo gerar frustração no futuro. Não fujo do contexto real, porém mostro caminhos, possibilidades e, aí sim, me uso e me abuso como exemplo de alguém que atravessou a ponte da utopia de braços dados com a realidade. Ainda acredito que a melhor forma de motivar é pelo exemplo. Trabalhei certa vez com uma gerente que queria incentivar a leitura entre os colaboradores da empresa, porém, ela nunca tinha lido um livro na vida. Não funcionou. Eu, despretensiosamente, chegava de olhos brilhando ao falar sobre um livro e, não raras vezes, via, dias depois, uma colega com o título sobre o qual eu havia “apaixonadamente” falado. Paixão. Essa palavra não deveria ser usada somente como referência a relacionamentos amorosos.

2. Conhecimento

Viagem é bagagem, literalmente. Ao viajar, a gente aprende sobre línguas, culturas, geografia, história. Uma viagem, brinco ao dizer, é uma bela metáfora da escola multidisciplinar. Compartilhar isso com alunos é enriquecê-los culturalmente, é o clichê “ampliar horizontes”.

3. Respeito

Ao viajar, aprendo a respeitar os costumes e as regras do local onde estou – as quais geralmente eu aprendo infringindo por desconhecê-las (risos). Trazendo isso pra nosso cotidiano, é possível ensinar nossos alunos a desconstruir conceitos de certo e errado, normal e anormal, e fortalecer a aceitação do “diferentemente iguais”, ou do “igualmente diferentes”.

Infelizmente ainda não ultrapassamos a barreira do livre ser, pensar e expressar, então, esse discurso, apesar de rebatido, precisa ser exaustivamente repassado a nossas “crianças”, pois isso interfere profundamente na formação do indivíduo. Enquanto educadora, abracei também a missão, bem pessoal, de desconstruir argumentos racistas, machistas e fundamentados em qualquer preCONCEITO alienaDOR.

4. Simplicidade

Viajando eu realmente aprendi o que é essencial. Depois de anos carregando malas abarrotadas de coisas que eu não usava, venho aprendendo a levar apenas aquilo que posso carregar em uma mochila. É uma regra de ouro. E, dessa forma, os hábitos se tornam mais simples e improvisados, duas características com as quais os professores, principalmente de escolas públicas, estão acostumados a lidar no dia a dia escolar, improvisando com os recursos que temos à mão. Transformar isso em conhecimento é agregar valor pra vida do estudante, conscientizando-o, inclusive, da supervalorização a tendências, modismos, imposições sociais, futilidades, e ensinando-os a viver de forma prática e simples – que não se confunda com acomodada.  

5. Organização

Uma viagem, do começo ao fim, depende de planejamento, inclusive, financeiro. Envolve ainda logística, pesquisa, leitura, detalhes minuciosos que farão a diferença no decorrer da jornada. Preciso mesmo dizer o quanto esses fatores são importantes para o aprendizado de um aluno? Grande parte dos sonhos de nossos estudantes depende de dinheiro, e é justamente por isso que muitos são desacreditados. Se você economiza para viajar, saberá dar a eles dicas de como priorizar para realizar determinada coisa, e não estou falando apenas de dinheiro, me refiro também a foco e determinação. Quanto à leitura e pesquisa, saliento a importância da busca pela veracidade da informação, pois há, principalmente no meio virtual, muita informação e, por vezes, até contraditória. Reforçar a importância da leitura é também tarefa do professor.  

Eu, apaixonada que sou por viagem, poderia escrever vinte mil caracteres sobre a transformação que ocorreu em minha vida desde que comecei a viajar. Sei que o termo “viagem”, por si só, pode remeter você a um lugar distante ou complexo, com longas horas de estrada, e pode ser mesmo. No entanto, aprendi também a ser uma turista dentro da minha própria cidade, uma exploradora da região em que vivo. E convido você a fazer o mesmo, quem sabe ainda nestas férias. Os ganhos, acreditem, são maiores que os gastos, e ultrapassam os que apresentei aqui, mas isso pode ser assunto para uma próxima reunião escolar? Por agora, ainda estamos de férias, e eu acabei de desafivelar a pesada mochila das costas depois de vinte dias de estrada. Apesar do peso, voltei mais leve, porque essa vivência não pesa, é leve e pode nos levar para bem longe, se você quiser, pois agora já não sou mais uma estranha – talvez um pouco estranha. Encontro vocês por aí ou por aqui. Boa viagem.  

O texto acima é de autoria de Milene Maciel, que compartilha conosco aqui suas experiências e vivências do processo de ensino-aprendizagem.

Conteúdo para educadoras(es)

Aqui no blog da Portabilis você encontra vários artigos sobre conceitos pedagógicos, competências e ideias para planos de aulas adaptados à BNCC e dicas importantes para gestoras(es) escolares e dirigentes municipais. Confira alguns destaques:

 

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