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Fundação Negro Amor e Portabilis: parceria que fortalece e qualifica a luta pela educação comunitária em Salvador

Aproximadamente 2.600 alunos, a maioria afrodescendente, são beneficiados com o sistema i-Educar, em 27 escolas comunitárias associadas a Associação de Escolas de Educação Comunitária da Bahia (AEEC), parceira da Fundação Negro Amor.

 

Nos bairros populares de Salvador, em comunidades com altos índices de vulnerabilidade social, onde a população tem pouco acesso a serviços básicos de educação, saúde, saneamento básico e transporte. É neste cenário desigual, de dificuldades e pouco acesso à tecnologia, que estão situadas as Escolas Comunitárias, hoje organizadas em Rede, pela Associação de Escolas de Educação Comunitária da Bahia (AEEC), uma parceira da Fundação Negro Amor.

As escolas comunitárias de Salvador têm sua origem na década de 70, período em que as organizações e manifestações comunitárias e populares despontavam em todos os grandes centros urbanos do país. Esses movimentos nasceram em decorrência do fluxo acelerado de urbanização, com grandes ondas de migrações de famílias do campo atraídas pelas oportunidades de trabalho nas cidades.

Essa população de migrantes necessitava, além de emprego e renda, de lugar para moradia e de condições mínimas de sobrevivência na cidade: acesso a água, energia elétrica, transporte e educação para os filhos. Diante da inexistência de políticas públicas que atendessem às demandas dos moradores, esse novo contingente populacional urbano organizou-se em torno de associações de moradores e, em torno delas, surgiram as escolas e creches comunitárias a fim de oferecer uma educação baseada no seu contexto socioeconômico e cultural.

Há sete anos, a Portabilis passou a caminhar ao lado destas iniciativas, com o objetivo de implantar na Rede de Escolas Comunitárias, o sistema de gestão escolar i-Educar. Todo o projeto, foi desenvolvido e cedido gratuitamente pela Portabilis à Fundação Negro Amor.

De acordo com a coordenadora executiva da Fundação Negro Amor, Ana Nossa, o i-Educar facilita a gestão escolar nas áreas administrativa e pedagógica, além de oferecer benefícios no acompanhamento da vida escolar das crianças, com emissão de documentos e relatórios com indicadores. “É uma parceria que fortalece e qualifica a luta pela educação pública e comunitária em Salvador. Hoje as escolas são pólos de irradiação social nessas comunidades, principalmente no contexto de pandemia que estamos vivendo. Mesmo sem aulas, as escolas estão de portas abertas, auxiliando não só alunos, mas toda a comunidade.  Por isso, todas as parcerias que vem para fortalecer o projeto são bem-vindas”, pontuou Ana.

Cumprindo o papel do poder público

A AEEC é uma parceria estratégica da Fundação Negro Amor e hoje conta com 104 escolas comunitárias associadas, situadas em bairros populares de Salvador, com público na maioria afrodescendente, envolvendo aproximadamente 800 educadoras e atendendo nove mil estudantes.

Segundo Ana, junto com a AEEC, a Fundação Negro Amor desenvolve ações com os públicos das escolas: “As escolas comunitárias não são da rede estadual, municipal e nem privada, são escolas que surgiram na década de 70, geridas por Associações de Moradores. As instituições foram criadas a partir do êxodo rural, de famílias que deixaram o Nordeste e o Sul buscando melhores oportunidades. As famílias iam se juntando nas periferias montando barracos, um movimento que ocorreu em todo o Brasil. Com a ausência do poder público nesses locais, e sem ter escolas, mães cuidavam de seus filhos e de crianças de outras mulheres, e isso foi tomando uma proporção maior e ao longo dos anos, as escolas foram se estruturando e as educadoras se profissionalizando, através da formação continuada”, explica Ana. 

As Escolas Comunitárias atendem crianças na creche, educação infantil e ensino fundamental 1, e são, na maioria dos casos, os únicos espaços escolares dos bairros onde estão instaladas. “Em muitas dessas comunidades, não há nenhuma outra escola pública, somente as escolas comunitárias. São escolas que lutam para existir e que prestam um trabalho importantíssimo”, frisou a coordenadora executiva.

Escola Aberta do Calabar: projeto piloto do i-educar

A parceria da Portabilis com a Fundação Negro Amor, iniciou com uma escola piloto, a Escola Aberta do Calabar. O primeiro contato com a Portabilis foi por meio da conselheira da Fundação Negro Amor Indaia Freire, que, lendo sobre os benefícios do sistema de software livre, buscou o apoio da empresa.

“Falamos da nossa necessidade, limitação e desafios. A Portabilis nos abraçou e alinhamos, juntos, formas de implantar o sistema. Recebemos não só a ajuda para implantação do sistema, mas todos os técnicos adequaram e ajustaram o sistema à nossa realidade. Além disso, a equipe é muito atenciosa e está sempre em contato”, disse.

“Aos poucos fomos expandindo e gerindo as dificuldades inerentes a nossa rede, como falta de computador e internet nas escolas, ausência de cultura digital da equipe escolar, consequências da exclusão digital que vivemos em nosso país, que acomete prioritariamente quem mora nas periferias”, explicou.

Ao longo desses anos, de acordo com Ana, foram realizadas capacitações sobre o i-Educar com as gestoras e responsáveis das escolas, em parceria com a Fundação Visconde de Cairu, que disponibiliza Laboratórios de Informática, além do apoio de estudantes do curso de Análise e Desenvolvimento de Sistemas.  “Em 2018 conseguimos capacitar 110 pessoas responsáveis por 58 escolas comunitárias, que beneficia a mais ou menos 5 mil crianças, mas infelizmente, há um rodízio muito grande de pessoas e profissionais nas escolas comunitárias, que conta, inclusive, com mão de obra voluntária, e os saberes adquiridos se perdem com quem sai das escolas, principalmente com relação ao i-Educar”, pondera a coordenadora.

Criando e preservando a memória institucional 

Atualmente, 27 escolas da Rede possuem o sistema da Portabilis, beneficiando 2.600 estudantes e 86 educadoras. Para Ana Nossa, o i-Educar representa a profissionalização das escolas comunitárias, já que é possível organizar dados, considerando que muitas escolas, ainda fazem o registro e a memória dos estudantes de forma manuscrita. Como forma de otimizar o processo de inclusão digital, Imira Guerra foi convidada para assumir essa frente de ação na Fundação Negro Amor: “A Portabilis nos dá suporte, nos auxilia. Cuidar dos dados das escolas comunitárias é algo altamente grandioso. Hoje, funcionários dessas 27 escolas estão alimentando os dados no sistema e nosso objetivo daqui para frente é capacitar e incluir o maior número de escolas ao sistema. Nosso grande desafio é consolidar, junto com as escolas comunitárias, a cultura de alimentar o sistema continuamente e usufruir de todo o benefício e praticidade que ele oferece para a gestão escolar no dia a dia. Mas para isso, um grande gargalo é a falta de computadores nas escolas para que o sistema possa ser implantado e alimentado”, relata Imira.

Hoje a AEEC dispõe de dois computadores, doados pela Fundação Negro Amor, para apoiar as escolas na alimentação de seus dados.

As escolas que estão com o sistema i-Educar implantado estão muito satisfeitas, como demonstra alguns relatos:  

“Participar do i-Educar é extremamente positivo. Contar com um sistema que faz uma análise quantitativa e qualitativa da vida escolar ajuda-nos a ter uma visão geral para aperfeiçoar, melhorar e capacitar nosso fazer educativo” – Geovani Souza, coordenadora pedagógica do Grupo de Jovens Liberdade Já;

“A Escola Aberta do Calabar como escola piloto do i-Educar, ao longo desses anos ganhou muito, pois o sistema agregou conhecimento e colabora efetivamente para a profissionalização da gestão de dados administrativos e pedagógicos das escolas comunitárias, que nunca tiveram oportunidade de utilizar um sistema de gestão escolar” – Nilza Santos, gestora da Escola Aberta do Calabar;

 “O i-Educar é um sistema que viabiliza a instrumentalização organizacional, pedagógica e administrativa da Rede de Escolas Comunitárias associadas à AEEC” – Ailton Moura, diretor da AEEC.

Um sistema que valoriza a ação comunitária

Segundo a diretora executiva, a maior parte dos responsáveis pelos alunos são compostos por catadores, empregadas domésticas e ambulantes.

Dessa forma, para Ana, o sistema valoriza a ação comunitária. Além disso, os pais/responsáveis se reconhecem e apropriam em uma caminhada de cidadania.

“As mães chegam aqui precisando de algum documento para utilizar em alguma outra área ou Programa Social, ou mesmo um papel de transferência, por exemplo, e tudo é encaminhado com muita agilidade, efetivando o trabalho e auxiliando as famílias. Dessa forma, elas também se sentem parte e ganham autonomia”, pontuou.

Parcerias que transformam e qualificam

Na opinião de Ana, o encontro da iniciativa privada, com o social e com o poder público, é a única forma de construir uma sociedade democrática, participativa, solidária, inclusiva e plural. “Aqui fazemos um trabalho de formiguinha, com recursos vindos exclusivamente do nosso fundador, mas a esperança e parcerias como essa com a Portabilis são o que nos movem e dão forças para continuar”, destacou.

Para o CEO da Portabilis, Tiago Giusti, apoiar instituições que transformam e impactam vidas faz parte do propósito e missão da empresa.   “Para nós é um imenso prazer ajudar a manter a memória dos estudantes viva. O trabalho da Fundação Negro Amor e da AEEC, é exclusivo com populações afrodescendentes historicamente excluídas, fundamental num país que busca equidade. Queremos frisar nosso apoio na prática, e dizer que estamos sempre abertos a colaborar e ajudar a promover, cada dia mais, essa inclusão digital e protagonismo juvenil”.

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    Tânia Giusti

    Tânia Giusti é bacharel e mestre em jornalismo, entusiasta da educação e escreve sobre como políticas públicas de educação e assistência social podem transformar a sociedade. Na bagagem, traz vivências jornalísticas do trabalho com assessoria de imprensa no setor público. Participe, mande relatos ou sugestões para [email protected]

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